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O acidente vascular encefálico (AVE) é a 2ª causa de morte no mundo e a 1ª na China. Dessa forma, adotar estratégias de prevenção de doença cerebrovascular é fundamental para reduzir não só mortalidade como também a morbidade que tal entidade causa no mundo inteiro.
Não é de hoje que sabemos que as plaquetas têm papel importante na fisiopatologia da doença e que isso ocorre não somente na fase aguda de um AVE. Sabemos também que um endotélio sadio é capaz de produzir substâncias que inibem a adesão/ativação plaquetária (ex.: prostaciclina, heparina). Postula-se também que a lesão endotelial promova a adesão plaquetária através de vias que parecem envolver homocisteína elevada e, portanto, uma baixa contagem de plaquetas (plaquetometria) e elevação dos níveis de homocisteína poderiam ser biomarcadores de disfunção endotelial e maior adesão plaquetária, traduzindo-se num maior risco de AVE.
O JACC publicou recentemente esse estudo chinês que foi desenhado a partir de premissas oriundas de estudos em animais sobre o papel da homocisteína e de um estudo (China Stroke Primary Prevention Trial – CSPPT) chinês que sugeriu que a reposição de ácido fólico seria capaz de reduzir em 21% a incidência de AVE em homens e mulheres hipertensos.
Usando dados desse trial, algumas questões foram levantadas sobre se a associação de homocisteína alta + plaquetometria reduzida aumentaria o risco de AVE. Estando esta hipótese correta, a reposição de folato (redutor de homocisteína e anti-oxidante) em hipertensos com baixa plaquetometria e homocisteína elevada poderia reduzir o risco de AVE. Todos os participantes do estudo que é foco dessa coluna foram participantes do CSPPT, que foi um trial randomizado e duplo-cego chinês que, de 2008 a 2013, envolveu participantes hipertensos de 45 a 75 anos em mais de 35 comunidades chinesas. Estes não possuíam diagnóstico de doença coronariana, AVE prévio, insuficiência cardíaca e nem doença cardíaca congênita. Os participantes não poderiam receber suplementação de vitamina B durante o seguimento.
Os pacientes selecionados tiveram seus genótipos (CC, CT ou TT) testados para Metilenotetrahidrofolato redutase (MTHFR), enzima fundamental no metabolismo da homocisteína em metionina, tendo vitamina B12 e folato envolvidos no processo. Dentro dos três genótipos possíveis, eles foram randomizados numa taxa 1:1 para ou receber um comprimido só com 10 mg enalapril (braço A) ou um comprimido com 10 mg de enalapril com 0,8 mg de ácido fólico (braço B); seguimento a cada três meses.
Exames de sangue em jejum foram colhidos para dosagens da plaquetometria, homocisteinemia, ácido fólico e vitamina B12, além de outros biomarcadores tradicionalmente associado a doença aterosclerótica. Foram avaliados também outras variáveis como: sexo, idade, tabagismo, etc.
Desfecho primário: AVE isquêmico/hemorrágico fatal ou não-fatal.
De um total de 10.789 participantes, 5.381 foram randomizados pro braço A e 5.408 para o braço B (os que recebem folato). Os pacientes foram subdividos em quartis quanto à plaquetometria: Q1 (<210000), Q2 (210 a 248000), Q3 (248 a 291000) e Q4 (>291000).
Resultados
Um total de 371 AVEs foram diagnosticados durante um seguimento/tratamento médio de 4,2 anos de duração. No braço A (sem folato), o risco de AVE no Q1 foi o maior (4,6%) quando comparado ao risco combinado dos outros três quartis (3,7%), sendo que esses dados são mais atribuídos ao subtipo isquêmico pela análise de subgrupo. No braço B, o risco do Q1 foi de 1,9% e o risco combinado dos outros três quartis foi 3,3%. Comparando o Q1 dos braços A e B, os resultados sugerem uma redução do risco absoluto em 2,7% (4,6% X 1,9%) e uma redução do risco relativo em 58% no modelo ajustado. O resultado foi consistente para as análises sobre possíveis “confundidores”, inclusive com análise dos subtipos de genótipos da enzima, principalmente em AVE isquêmico. A amostra de AVEh foi muito pequena e não houve poder estatístico para esse subtipo. Quando ajustados pelos valores homocisteinemia, os pacientes com plaquetometria baixa (Q1) e homocisteinemia alta (>15milimol/L), o risco de AVE foi reduzido de 5,6% para 1,8% com a reposição de folato.
Considerações
- Estudo restrito a uma região chinesa onde a deficiência de ácido fólico é provavelmente maior que em outros locais (baixa ingesta), pois não há lei que obrigue um “reforço” de ácido fólico em grãos que fazem parte da dieta local;
- Mecanismo pouco definido pelo qual o ácido fólico age e sua relação com a plaquetometria e a fisiopatologia de doença aterosclerótica;
- Dosaram plaquetometria no início do seguimento apenas e não ao longo do trial;
- Dose do ácido fólico reposto;
- Seria o ácido folínico benéfico no subgrupo com genótipo TT que tem um nível de homocisteína 25% maior?
Referências:
- Xiangyi Kong, MD et al; Platelet Count Affects Efficacy of Folic Acid in Preventing First Stroke;
JACC V O L . 7 1 , N O . 1 9 , 2 0 1 8
Excelente matéria