Bicarbonato na acidose metabólica grave: novas evidências revelam melhora no desfecho

Reposição de bicarbonato no paciente crítico com acidemia aguda é uma prática frequente. Porém, esta opção ainda é cercada de controvérsias.

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Reposição de bicarbonato no paciente crítico com acidemia aguda é uma prática relativamente frequente em terapia intensiva. Porém, esta opção ainda é cercada de controvérsias e, no dia a dia, o que observamos é que muitos plantonistas repõem o bicarbonato baseando-se em suas experiências clínicas. O Surviving Sepsis Campaing em 2017 chegou afirmar que “o efeito da administração de bicarbonato de sódio sobre os requisitos hemodinâmicos e necessidade de vasopressores em pH mais baixo, bem como o efeito nos desfechos clínicos em qualquer nível de pH, é desconhecido” e que “nenhum estudo examinou a efeito da administração de bicarbonato sobre os resultados”.

O The Lancet publicou recentemente um estudo, ou melhor, o primeiro grande ensaio clínico randomizado, para nos ajudar a esclarecer essa dúvida. Outro ponto positivo do estudo é que  foi multicêntrico, tendo participado 26 unidades de terapia intensiva (UTIs) na França.  O objetivo foi avaliar se a infusão de bicarbonato de sódio melhoraria estes resultados em pacientes gravemente doentes.

Foram incluídos pacientes adultos (com idade ≥18 anos) internados em UTI com acidúria grave (pH ≤ 7,20, PaCO2 ≤ 45 mm Hg e concentração de bicarbonato de sódio ≤20 mmol / L) e com uma pontuação total no Sequential Organ Failure Assessment (SOFA) Score maior ou igual a 4 ou concentração de lactato arterial maior ou igual a 2 mmol/L.

Os pacientes foram randomizados (1:1), através de uma plataforma web em dois grupos, o que não recebeu bicarbonato de sódio (grupo controle) e o que recebeu bicarbonato de sódio intravenoso (grupo bicarbonato) para manter o pH arterial acima de 7.30. O protocolo recomendou que o volume de cada infusão deve estar dentro da faixa de 125 a 250 mL em 30 minutos, com um máximo de 1000 mL em 24 horas após a inclusão. O desfecho primário foi um composto de morte por qualquer causa no dia 28 e a presença de pelo menos menos uma falência de órgãos no dia 7.

Participaram do estudo 389 pacientes (194 no grupo controle e 195 no grupo bicarbonato). O desfecho primário ocorreu em 138 (71%) de 194 pacientes no grupo controle e 128 (66%) de 195 no grupo bicarbonato. Alcalose metabólica, hipernatremia e hipocalcemia foram observados com maior frequência no grupo bicarbonato do que no grupo controle, sem complicações fatais relatadas.

Os pesquisadores relataram que na população geral a infusão de bicarbonato de sódio não foi associada a uma melhora no desfecho primário. Porém, no estrato clínico de pacientes com lesão renal aguda (Acute Kidney Injury Network score de 2 ou 3), o desfecho primário ocorreu com menor frequência no grupo do bicarbonato do que no grupo de controle. Além disso, o número de dias vivos e livres de terapia de substituição renal foi maior no grupo bicarbonato do que no grupo controle tanto na população geral, quanto  no estrato definido anteriormente de pacientes com lesão renal aguda.

É importante lembrar que o estudo não está livre de limitações. Não houve solução controle para ser feita no grupo controle porque não há fluido sem efeito sobre o equilíbrio ácido-base. Além disso, não havia como mascarar os médicos que cuidam dos pacientes na UTI, pois a monitorização regular da gasometria arterial faz parte dos cuidados de rotina em pacientes com acidemia metabólica grave. Outra limitação é que o protocolo não usou o cálculo do déficit de base para fornecer uma quantidade sob medida para infusão do bicarbonato, sugerindo um volume de bicarbonato de sódio 4,2% de125–250 ml por infusão.

O tratamento da acidemia metabólica em pacientes críticos é uma questão delicada e desfiadora. Mais estudos que também sejam, preferencialmente, randomizados e multicêntricos, devem ser feitos para investigar se a infusão de bicarbonato pode de fato melhorar os desfechos clínicos.

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Referências:

  • Jaber S et al. Sodium bicarbonate therapy for patients with severe metabolic acidaemia in the intensive care unit (BICAR-ICU): A multicentre, open-label, randomised controlled, phase 3 trial. Lancet 2018 Jul 7; 392:31. || https://doi.org/10.1016/S0140-6736(18)31080-8

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